Categories: Crônicas originais

Crônica das eleições 2022

Fui votar discreta, de blusa branca e um singelo adesivo de Lula e Haddad no peito esquerdo. Logo na entrada do colégio de votação, um homenzarrão de voz grossa, aquelas vozes de macho viking, sabe?, passou por mim falando ao telefone:

  • Se o Lula ganhar, eu vou embora do Brasil! Não quero saber, vou embora do Brasil!

Ele passou na minha frente com passos firmes e decididos de quem acha que vai mudar alguma coisa e esperneia quando descobre que não vai mudar porra nenhuma – mas a voz é grossa. Ele continua:

  • É Bolsonaro na cabeça! E concluiu com a frase medieval: “Deus acima de tudo!”

Depois de 50 minutos na fila, votei. Tempo bem mais curto do que as 2 horas e 40 minutos do primeiro turno. Andei um pouco pela UNICAMP para mostrar a minha mãe, que está de turista, o lugar em que estudei.

Vi algumas pessoas de amarelo e senti um misto de antipatia e medo delas. Vi algumas pessoas de vermelho e busquei contato visual para enviar mentalmente o meu “tamu junto, guerreirx”.

Pela tarde, fui a um churrasco e, ao acompanhar a notícia de que os criminosos da Polícia Rodoviária Federal tentavam atrapalhar com blitzes pessoas – especialmente pobre, diga-se – que iriam votar, tomei um chevette para me acalmar e passar o tempo.

Começou a apuração e fiquei feliz e aliviada quando Lula virou, mais cedo do que imaginávamos, aos 67% das urnas apuradas. A distância dos votos foi pequena mas, a partir daí, eu já estava em paz. Meu país não viraria Bolsonaristão.

Fui para casa de carona; buzinávamos e fazíamos o L (fizemos mesmo!) para as pessoas sorridentes que comemoravam na rua. Sabia, dentro de mim, que a nossa guerra contra o fascismo não havia acabado, mas agora poderíamos lutar sem ter que lidar com um presidente arruaceiro; ele será agora um arruaceiro sem caneta e sigilo de 100 anos na mão.

A melodia do samba “Tô voltando” ficou tocando em minha cabeça até eu conseguir dormir. “Tô voltando” pode simbolizar a volta do Lula. Mas, na verdade, quando a ouço, eu imagino o povo, com toda sua humildade e amor às coisas simples, dançando unido e feliz por saber que vai ter de volta um governo que se importa com eles.

Olá, obrigada por ter chegado até aqui. Nesse espaço, eu costumo divulgar crônicas originais por mim escritas. Portanto, se você quiser continuar acompanhando o meu trabalho, siga-me nas redes sociais. Um abraço!

Eva Maia Malta

Comments are closed.

Recent Posts

[POEMA] O próprio breu

É preciso noite pra que num acordar assustado Tudo ao redor me pareça tão impressionante. Aquele lençol cobrindo aquelas pernas…

1 ano ago

Dia de uma terrorista presa por Xandão

-Não tem provas. -Mas tia Nélia, dá pra ver que é você, não faz sentido negar. O advogado rodou o…

2 anos ago

The Damned – Os Deuses Malditos

Perturbador. Brutal. Revelador. Sempre me perguntei por que parece haver uma ligação entre pessoas perversas e regimes autoritários. The Damned,…

2 anos ago

Uma viagem de Uber

O senhorzinho me cumprimentou com simpatia quando entrei em seu carro. “Ginásio do Taquaral?” - ele perguntou, querendo confirmar o…

2 anos ago

A sangue frio e a arte de ver além

Em 1966, Truman Capote publicava seu livro “A sangue frio” que conta os detalhes do assassinato da família Clutter e…

2 anos ago

O nascimento da tragédia, de Friedrich Nietzsche

Seria o pessimismo o sinônimo de força de espírito, enquanto o otimismo o sinal da decadência e fraqueza? É com…

3 anos ago