Lúcia estava sentada na minha sala, uma de suas mãos segurava a bolsa que estava sobre as suas pernas, enquanto a outra segurava o suco de laranja que eu havia lhe oferecido. Ela me dissera que foi lá para passear um pouco, mas seus olhos estavam tristonhos e depois de um giro em um assunto qualquer voltava a falar do que de fato ocupava sua mente; o que ela queria mesmo era desabafar. Eu sentia por ela uma pena contida, mas ao mesmo tempo era divertido ver suas angústias de apaixonada. Afinal como é ridículo o amor alheio. Quem foi que disse isso mesmo? Neruda? Quintana? Não lembro, mas é verdade.
Lúcia tentava aparentar que estava levando de letra; volta e meia ela se ajeitava no sofá e com o ar orgulhoso falava: “já passei por muita coisa” ou “não é isso que vai me abater”. O que Lúcia não sabia, ou talvez soubesse, mas não se dava conta, é que muita gente já sentou naquele sofá onde ela estava e eu já tinha escutado frases desse tipo várias vezes, eu mesma já as usei. Quanto mais o esforço para parecer despreocupada, mais eu sabia que ela sofria.
A angústia de Lúcia consistia em dois fatores: um, a paixão desenfreada por seu novo namorado, do qual ela tentava obter, sem muito sucesso, a segurança de que era devidamente correspondida em seu amor; e dois, a sensação de que estavam todos contra o relacionamento deles, que tentavam convencê-la de que ele não gostava dela tanto assim e acabavam colocando coisas em sua cabeça.
A mais recente havia sido sua amiga de muitos anos, Carminha. Elas se conheciam desde a adolescência e estiveram uma ao lado da outra em muitos momentos, mas ultimamente a amiga não a entendia. Esteve em sua casa na semana anterior e, segundo ela, as duas estavam se divertindo, tomando umas cervejas, até que Carminha começou a entrar no assunto de Fernando. Lúcia ouviu tentando se convencer de que era apenas preocupação de amiga, mas perdeu a paciência quando a outra disse que estava circulando boatos de traição, que Fernando estava envolvido com outra mulher lá pelos lados de São Gonçalo. Não era a primeira vez que Carminha insistia nessa história. Na cabeça de Lúcia, a amiga falava aquilo porque não sabia como Fernando lhe tratava bem e como lhe olhava com um brilho que só podia significar amor. Carminha não era capaz de enxergar esse olhar; se fosse, compreenderia o porquê que ela não conseguia parar de ter fé em seus sentimentos.
Eu entendia o que sentia Lúcia. Por um lado, ela amava alguém que no fundo também suspeitava que não a amava de volta. Passava horas pensando nas frases que ele dizia, ou que deixava de dizer, pensava no significado de cada gesto seu, tentava medir seu amor. Formulava explicações para o fato dele passar dias sem ligar, dele não procurá-la como ela o procurava e confortava-se ao menor sinal de afeto e consideração que ele lhe oferecia. Esses sinais alimentavam suas esperanças ao mesmo tempo que lhe atormentavam com dúvidas.
Pelo outro lado, ela contava com seus amigos para diminuir um pouco da sua angústia. Queria que as pessoas ao seu redor lhe convencessem daquilo que ela queria muito acreditar, mas que lhe faltavam provas: de que era amada. Como ela vivia com Fernando situações que se contradiziam, precisava que alguém lhe dissesse: “não, ele gosta muito de você, dá p’ra ver”. Ela precisava de testemunhas. Essa é a verdadeira função das testemunhas de nossos casamentos, provar para nós mesmos que um dia fomos amados.
Mas para sua frustração isso não estava acontecendo e, de uns tempo para cá, as pessoas faziam o contrário, tentavam diminuir suas lembranças boas e mandavam-na abrir os olhos. A atitude de Carminha foi um golpe duro, pois ela traiu o posto de melhor amiga ao não ser mais um bom ouvido. Não podia mais recorrer-lhe para compartilhar suas dúvidas, pois sabia quais respostas teria… Afinal, a amiga não sabia dos olhares que seu amor lhe dirigia. Por isso, preferia ficar em silêncio. E sentia-se só.
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