A música é a arte que mais facilmente penetra a alma humana. A melodia, que é a verdadeira linguagem universal, une pessoas de diferentes lugares através de um gosto comum e é capaz de ultrapassar o limite do tempo. Além disso, a música não costuma nos pedir muito. De todas as artes, talvez ela seja a menos exigente e, para aproveitá-la, é necessário a princípio apenas nos deixar levar pela sensação que ela nos causar.
Mas existe uma outra característica da música, uma que é pouco falada e que a torna mais especial: ela nos é impossível de segurar e está sempre nos escapando; fugidia e efêmera, como tudo que é belo. A música vem de forma fácil e suave, mas deixa nossos sentidos da mesma forma, deixando para trás seu rastro na forma de sensação como uma marcante fragrância de perfume.
Como uma intérprete amadora de piano, essa percepção me surgiu quando não pude mais controlar o fluxo das músicas que aprendia a tocar e me vi lutando para aprender músicas mais complexas, enquanto esquecia lentamente como tocar bem as músicas que já havia passado muito tempo para aprender. Isso me fez perceber como a música nos escapa e temos que estar constante buscando-a, indo a seu encontro. Para intérpretes – músicos, cantores – isso é particularmente angustiante, por você não poder mantê-la e perceber que ela nunca irá te pertencer; como se a música, uma vez exposta, ganhasse vida própria e se perdesse no mundo. Tal angústia também pode ser experimentada por intérpretes de diferentes artes, como teatro e dança. Ações cuja emoção mais cedo ou mais tarde irá desaparecer, obrigando o artista a repetir seu trabalho a fim de mantê-lo vivo.
Apesar da melancolia que isso pode trazer, o lado livre e desprendido da música a torna mais especial. Ela é como uma dessas pessoas que surgem em nossas vidas, a tornam melhor e, livres que são, passam – vão atrás de outras vidas para iluminar. Sua momentaneidade é o que a faz ser tão cativante e até mágica, pois para contemplá-la precisamos no conectar a ela no momento de sua execução, ou seja, no presente. Assim, ela nos presta um favor ao nos levar a agir como deveríamos fazer com mais frequência: viver o agora.
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